06 de Março de 2021
Maioridade Penal: a grande perda de tempo de 2015
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27/06/2015 14:41 - Atualizado em 27/06/2015 14:47
Maioridade Penal: a grande perda de tempo de 2015 0
27/06/2015 14:41 - Atualizado em 27/06/2015 14:47
Mesmo com toda a crise econômica e política, o assunto mais discutido do Brasil tem sido a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos. A ampla maioria da população brasileira é favorável à ideia e surgiram quatro projetos sobre o tema na Câmara dos Deputados. Um deles foi aprovado e seguiu para o Senado. Porém, fica a pergunta: será que nossa sociedade está mirando o alvo certo?
Quantos projetos da Câmara tratam da questão penitenciária brasileira? Quantos projetos melhoram a nossa capacidade de ressocializar os jovens que são apreendidos - leia-se presos - pela justiça? A resposta é muito simples: nenhum. Todas as propostas, incluindo a que foi aprovada, mexem apenas em números superficiais. Uma mexe na idade, outra nas penas e algumas mexem nas duas coisas. No geral, o panorama é prender mais gente, por mais tempo. Tudo o que a torcida quer ver. Mas o perigo reside justamente na parte menos midiática, que são os números caóticos do sistema prisional brasileiro, incluindo aí as prisões para menores chamadas de “Unidades de Internação”.
Segundo o último Censo Carcerário do país, realizado em junho de 2014 pelo Conselho Nacional de Justiça, o Brasil tem 716 mil presos e um déficit de 358 mil vagas. O que significa que hoje nosso sistema carcerário opera no dobro da capacidade. Isso sem contar os 16 mil condenados com mandado de prisão “em aberto”. É por causa disso que parte dos presos não chega a cumprir toda a pena ou é solto com as famosas tornozeleiras (pulseiras) que não impedem ninguém de cometer crimes. Nesse número, ninguém quer mexer. Ninguém faz lei para resolver isso.
O que o Brasil quer de seu sistema prisional? Aqui não se retira ninguém da sociedade, porque não há prisão perpétua. Então a decisão óbvia deveria ser pela ressocialização, mas o que se pratica é mera vingança contra os criminosos, jogando-os em celas imundas, superlotadas e sem nenhum tipo de segurança. Lançamos pessoas em um mundo cão. Se o pensamento for vingar-se dos bandidos, acertamos em cheio. Mas tem um problema: eles saem de lá e também se vingam. Hoje nosso sistema prisional fabrica bandidos cada vez mais violentos. E isso vale também para as tais “Unidades de Internação”.
Mas tem números ainda piores. O Brasil, com seus 716 mil presos, tem a 3º maior população carcerária do mundo. Só isso já seria algo triste. Mas piora, quando colocamos a coisa em índices: nosso país tem 358 presos para cada 100.000 habitantes. Na Alemanha, esse índice é de 78 presos para cada 100.000 habitantes. E vale a pena comentar que lá não se prende ninguém antes dos 18, entre 18 até 21 os presos são considerados jovens adultos e entram em um sistema especial e maioridade mesmo só depois dos 21! O que prova que a redução da criminalidade não necessariamente está associada à idade em que se pode prender um indivíduo.
Mas você talvez esteja achando a comparação com a Alemanha uma covardia, porque a cultura lá é muito diferente. Tem razão. O Brasil vem se desenvolvendo há 500 anos, conquistou sua independência há quase 200 e nunca teve guerras em seu território. Enquanto a Alemanha foi completamente destruída duas vezes. A última a 70 anos. Foi dividida em dois países e, quando se unificou em 1989, teve que lidar com a absorção de toda a população da parte oriental, miserável e sufocada pelo socialismo. Realmente, é uma covardia.
Mas a Alemanha se reconstruiu e sobre um sólido modeloeducacional. Todo o ensino é considerado um direito de todos os cidadãos. As comunidades influenciam no ensino e as decisões são tomadas junto com os pais. Dependendo da realidade, os jovens podem ser preparados para exercer um ofício técnico – muitíssimo valorizado e bem remunerado – e entrar mais rapidamente no mercado de trabalho, ou estender os estudos e ir para uma universidade, também gratuita.
Lá o índice de analfabetismo é de 1%. Aqui é de 9% e nem precisamos comentar a realidade das escolas brasileiras. Esse número é muito mais complicado de mexer. E não vai mudar em um ou dois mandatos. É um processo que, como na Alemanha, vai durar mais de 20 anos. Mas ninguém no Brasil faz lei pensando em todo esse tempo. Aqui as coisas são feitas de 4 em 4 anos.
Não estou querendo dizer que os jovens infratores são “vítimas da sociedade”. Nossa sociedade é que é vítima de décadas de políticas irresponsáveis. Um jovem se forma com educação,religião e família. É esse tripé que vai garantir o surgimento do caráter e dos valores, e permitirá olhar para o futuro com esperança.
Mas a educação vai mal, o Estado finge que todos são ateus e a família se degrada cada vez mais. Nosso sistema carcerário, que deveria recuperar as pessoas, cria bandidos ainda piores. Some-se a isso a crise econômica, desemprego crescente, serviços públicos ineficientes e corrompidos. E no final das contas, perdemos nosso tempo em mudar um número de 18 para 16, sem necessariamente decidir o que fazer com as consequências ou atacar as causas.
Não é uma questão de ser contra ou a favor a maioridade penal. A questão é provocar mudanças muito mais profundas –e que levem todo o sistema em consideração. Dois anos a mais ou a menos não vão fazer muita diferença. O problema é saber o que fazer com os presos, como devolvê-los à sociedade e como evitar que nossos jovens sejam corrompidos pelo crime. O que precisa dar certo são as pessoas, não os números.
Maioridade Penal: a grande perda de tempo de 2015
27/06/2015 14:41 - Atualizado em 27/06/2015 14:47
Mesmo com toda a crise econômica e política, o assunto mais discutido do Brasil tem sido a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos. A ampla maioria da população brasileira é favorável à ideia e surgiram quatro projetos sobre o tema na Câmara dos Deputados. Um deles foi aprovado e seguiu para o Senado. Porém, fica a pergunta: será que nossa sociedade está mirando o alvo certo?
Quantos projetos da Câmara tratam da questão penitenciária brasileira? Quantos projetos melhoram a nossa capacidade de ressocializar os jovens que são apreendidos - leia-se presos - pela justiça? A resposta é muito simples: nenhum. Todas as propostas, incluindo a que foi aprovada, mexem apenas em números superficiais. Uma mexe na idade, outra nas penas e algumas mexem nas duas coisas. No geral, o panorama é prender mais gente, por mais tempo. Tudo o que a torcida quer ver. Mas o perigo reside justamente na parte menos midiática, que são os números caóticos do sistema prisional brasileiro, incluindo aí as prisões para menores chamadas de “Unidades de Internação”.
Segundo o último Censo Carcerário do país, realizado em junho de 2014 pelo Conselho Nacional de Justiça, o Brasil tem 716 mil presos e um déficit de 358 mil vagas. O que significa que hoje nosso sistema carcerário opera no dobro da capacidade. Isso sem contar os 16 mil condenados com mandado de prisão “em aberto”. É por causa disso que parte dos presos não chega a cumprir toda a pena ou é solto com as famosas tornozeleiras (pulseiras) que não impedem ninguém de cometer crimes. Nesse número, ninguém quer mexer. Ninguém faz lei para resolver isso.
O que o Brasil quer de seu sistema prisional? Aqui não se retira ninguém da sociedade, porque não há prisão perpétua. Então a decisão óbvia deveria ser pela ressocialização, mas o que se pratica é mera vingança contra os criminosos, jogando-os em celas imundas, superlotadas e sem nenhum tipo de segurança. Lançamos pessoas em um mundo cão. Se o pensamento for vingar-se dos bandidos, acertamos em cheio. Mas tem um problema: eles saem de lá e também se vingam. Hoje nosso sistema prisional fabrica bandidos cada vez mais violentos. E isso vale também para as tais “Unidades de Internação”.
Mas tem números ainda piores. O Brasil, com seus 716 mil presos, tem a 3º maior população carcerária do mundo. Só isso já seria algo triste. Mas piora, quando colocamos a coisa em índices: nosso país tem 358 presos para cada 100.000 habitantes. Na Alemanha, esse índice é de 78 presos para cada 100.000 habitantes. E vale a pena comentar que lá não se prende ninguém antes dos 18, entre 18 até 21 os presos são considerados jovens adultos e entram em um sistema especial e maioridade mesmo só depois dos 21! O que prova que a redução da criminalidade não necessariamente está associada à idade em que se pode prender um indivíduo.
Mas você talvez esteja achando a comparação com a Alemanha uma covardia, porque a cultura lá é muito diferente. Tem razão. O Brasil vem se desenvolvendo há 500 anos, conquistou sua independência há quase 200 e nunca teve guerras em seu território. Enquanto a Alemanha foi completamente destruída duas vezes. A última a 70 anos. Foi dividida em dois países e, quando se unificou em 1989, teve que lidar com a absorção de toda a população da parte oriental, miserável e sufocada pelo socialismo. Realmente, é uma covardia.
Mas a Alemanha se reconstruiu e sobre um sólido modeloeducacional. Todo o ensino é considerado um direito de todos os cidadãos. As comunidades influenciam no ensino e as decisões são tomadas junto com os pais. Dependendo da realidade, os jovens podem ser preparados para exercer um ofício técnico – muitíssimo valorizado e bem remunerado – e entrar mais rapidamente no mercado de trabalho, ou estender os estudos e ir para uma universidade, também gratuita.
Lá o índice de analfabetismo é de 1%. Aqui é de 9% e nem precisamos comentar a realidade das escolas brasileiras. Esse número é muito mais complicado de mexer. E não vai mudar em um ou dois mandatos. É um processo que, como na Alemanha, vai durar mais de 20 anos. Mas ninguém no Brasil faz lei pensando em todo esse tempo. Aqui as coisas são feitas de 4 em 4 anos.
Não estou querendo dizer que os jovens infratores são “vítimas da sociedade”. Nossa sociedade é que é vítima de décadas de políticas irresponsáveis. Um jovem se forma com educação,religião e família. É esse tripé que vai garantir o surgimento do caráter e dos valores, e permitirá olhar para o futuro com esperança.
Mas a educação vai mal, o Estado finge que todos são ateus e a família se degrada cada vez mais. Nosso sistema carcerário, que deveria recuperar as pessoas, cria bandidos ainda piores. Some-se a isso a crise econômica, desemprego crescente, serviços públicos ineficientes e corrompidos. E no final das contas, perdemos nosso tempo em mudar um número de 18 para 16, sem necessariamente decidir o que fazer com as consequências ou atacar as causas.
Não é uma questão de ser contra ou a favor a maioridade penal. A questão é provocar mudanças muito mais profundas –e que levem todo o sistema em consideração. Dois anos a mais ou a menos não vão fazer muita diferença. O problema é saber o que fazer com os presos, como devolvê-los à sociedade e como evitar que nossos jovens sejam corrompidos pelo crime. O que precisa dar certo são as pessoas, não os números.
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